Ser pai não é uma missão fácil.
Muitos ainda são considerados o alicerce e provedor da família, por mais que
essa realidade esteja mudando com os tempos. Eles costumam ser vistos como
super-heróis pelos filhos. Ao pai também cabe educar, cuidar, amar, dar suporte.
E é justamente nesta definição que o técnico em informática Luzikley Aparecido
de Paula Araújo se encaixa. Com pouco mais de 40 anos, Kley, como é conhecido,
ao ter a filha do meio diagnosticada com câncer, viu sua vida virar de
ponta-cabeça e descobriu superpoderes que até então não sabia que tinha.
Pai de Kawanny (12 anos), Kaylanne
(8 anos) e Kathlynn (7 anos), Kley sempre dividiu as tarefas com a esposa
Viviana. Ele define que a casa, em Lorena (interior de São Paulo), sempre
funcionou com trabalho de equipe: ele trabalhando e a esposa sendo dedicada à
casa. “Meu trabalho me permite ficar em casa, com as meninas. Então, sou
extremamente participativo. Um dia, chegando em casa, encontrei a Kayllanne
passando mal. Ela tinha desmaiado, vomitado. Levei ao hospital enquanto a minha
esposa cuidava das outras filhas”, lembra.
Mal sabia Kley que aquele dia
seria o primeiro de uma rotina exaustiva de acompanhamento de Klaylanne ao
médico. Passados alguns meses, uma nova crise aconteceu e a menina desmaiou
novamente. Desta vez, ela estava em Jundiaí na casa da tia. E foi no hospital
em Jundiaí, longe dos pais, que um exame apontou o que mais tarde seria
diagnosticado como tumor cerebral. O pai lembra como recebeu a notícia de que a
filha tinha passado mal. “Minha esposa só chorava ao telefone. Tentei me
acalmar para tranquilizá-la. A gente nunca espera uma coisa dessas. Falaram que
tinha uma mancha, que era tumor e tinham que avaliar. Foi uma das piores
notícias da minha vida. Ver um filho passando por isso é muito grave”, lembra.
Naquela noite Kley venceu, sem
perceber, um primeiro desafio. “Fiz algo que nunca tinha feito. Peguei o carro
e saí. Fui conversar com meu chefe que é como um amigo para mim e depois com o
padrinho da Klaylanne. Me recompus e me agarrei na fé. Consegui naquele momento
voltar a ser o esteio da minha família. Eu tinha que ter estrutura e tinha que
estar bem”, conta.
A chegada ao Centro Infantil
Boldrini, referência em
tratamento onco-hematológico na América Latina, não demorou dois dias
depois da ida ao hospital em Jundiaí. E em maio de 2017, Klaylanne, então com
seis anos, fez a primeira cirurgia para a retirada do tumor. “A minha ficha
demorou a cair. Até a cirurgia não tive muito tempo de me deprimir. Chorava,
mas tinha que ser forte. O baque veio na hora que ela entrou na cirurgia. Você
fica mudo, se sente impotente”, descreve o pai.
Foram quase oito horas de
cirurgia que, segundo ele, pareciam dias. Até que ela saiu do Centro Cirúrgico:
“Foi mais emocionante ver ela saindo da cirurgia do que acompanhar o nascimento
dela. Naquele dia ela renasceu. ”
Depois da cirurgia, a rotina da
família mudou completamente. “Morávamos em Lorena e temos duas outras filhas.
Então, contávamos com a ajuda dos meus pais enquanto estávamos no Boldrini
acompanhando o tratamento da Klaylanne. Com o tempo, comecei a revezar com
minha esposa as estadas. Passava uma semana em Lorena e o resto em Campinas. A
doença mexe com o nosso emocional, com o psicológico, com o financeiro e a
gente tem que saber dosar para lidar com tudo isso. Eu cheguei a ter medo e
senti dor com essa situação, mas nunca deixei de acreditar que daria certo”.
Klaylanne passou por sessões de
radioterapia e quimioterapia e em dezembro de 2017 o tratamento terminou. A
família voltou para Lorena e retornava ao Centro Infantil Boldrini para a
manutenção de tempos em tempos. Até que em outubro de 2018, o inesperado
aconteceu: uma ressonância apontou um tumor pequeno, cujo tratamento era uma
nova cirurgia. “Naquele momento meu chão abriu pela segunda vez. Mas estávamos
mais conscientes do que era a doença e o tratamento. Remodelamos de novo a
nossa vida. E as viagens entre Lorena e Campinas voltaram a ser rotina. Foram
várias idas e vindas”, pontua.
Klaylanne operou novamente no
final do ano passado e hoje se encontra em tratamento. E durante todo esse
tempo, Kley esteve ao lado dela e ainda arranjou forças para se doar ao
hospital, fazendo fotos e editando vídeos de eventos. “É um jeito mínimo de
retribuir. Se é que posso retribuir o que o Boldrini faz por ela e pelas
famílias”, define.
Kley ainda filma a rotina da
filha e coloca em sua página no facebook (Kley Klaylanne). “Começou como um
modo de dar notícias para a família que estava longe. Agora é um jeito de homenagear
minha filha e dar forças a outras famílias e pacientes e de ecoar o que o
Boldrini faz”.
Há um mês Kley tomou uma
importante decisão para a família: com a morte de seu pai, toda a família se
mudou para Jundiaí. “Isso encurta as nossas viagens ao Boldrini. Estamos em
Jundiaí porque tenho irmã, família para nos ajudar com as duas outras filhas.
Não podia descuidar da Klaylanne, mas tinha que estar presente para as outras
duas. Então essa rotina de viagem entre Lorena, Jundiaí e Campinas permanece. ”
E é sobre presença a maior lição
que Kley passa para os outros pais do Centro Boldrini. “A gente não pode dar
conselho, mas eu sugeriria que os pais estejam presentes. Sempre. A gente vê
tanta mãe sozinha enfrentando a doença dos filhos, tanta separação. Fique
sempre junto. Eu vejo por mim. Só de eu estar com ela no hospital, ela sorri”.
Para este Dia dos Pais, Kley só quer um presente, aquele que pede a Deus todos os dias: “Eu quero a cura dela. O resto é supérfluo”, termina.